Já estamos acostumados com carros ultrarrealistas escaneados e renderizados em 3D. Eles estão em filmes, games, flagras falsos, projeções em revistas, em todo lugar. O fato de conseguirmos fazê-los tão bem ainda me parece ficção científica. Mas a origem de tudo é bem mais antiga e humilde do que você pode pensar: em 1972, com estudantes, réguas e um Fusca. Carros (e outros objetos) podem, claro, ser modelados à mão em aplicativos 3D mas, para maior precisão, carros de verdade têm suas medidas calculadas até os nanômetros e passam por escâneres que usam lasers e todo tipo de tecnologia avançada. Dê só uma olhada neste vídeo que documenta o processo que os desenvolvedores de Forza usam para conseguir um nível milimétrico de detalhes em seus carros. É bem impressionante. Mas eu acho que o que o pioneiro da computação gráfica Ivan Sutherland e seus alunos fizeram no Laboratório de Gráficos no departamento de Ciência da Computação da Universidade de Utah, no início dos anos 70, é ainda mais impressionante. Vamos contextualizar o nível dos computadores daquela época, quando Sutherland e sua equipe estavam desenvolvendo os processos e algorítimos usados para modelagem e renderização em 3D: os computadores ainda eram do tamanho de geladeiras, e a maioria das pessoas sequer tinha visto um de perto. Telas de vídeo ainda eram raridade, é provável que o computador mais potente que as pessoas normais operassem diretamente fosse uma máquina de Pong, que era capaz de exibir dois traços, um ponto e uma linha. E foi nesta época que Sutherland decidiu descobrir como exibir e interagir com modelos tridimensionais virtuais em um computador.
Quando perguntado como conseguiu resultados tão bons em uma época onde tudo conspirava contra, ele respondeu o seguinte: ''Bom, eu não sabia que era difícil''.
Enquanto Sutherland e sua equipe desenvolviam algorítimos 3D para as telas, logo saíram dos objetos simples e retilíneos e precisavam de dados para objetos mais complexos, com curvas. O foco do projeto eram as técnicas de mapeamento poligonal (que agora estão por toda parte) para se aproximar de superfícies mais complexas. Mas eles não tinham softwares de modelagem porque ninguém havia pensado nisso antes. Então eles precisavam escanear um objeto físico, quebrar sua superfície em polígonos, medir cada uma das linhas e colocar os dados em seus computadores.
Para “escanear” um objeto em 3D, duas coisas eram essenciais: um objeto e um escâner O objeto foi o Fusca 1967 da esposa de Sutherland, Marsha. O escâner foram os alunos de Sutherland, munidos de tinta e réguas. Eles mapearam os polígonos sobre o próprio Fusca, e mediram cada linha no que deve ter sido o trabalho mais chato e empolgante ao mesmo tempo que já foi feito. Os dados resultantes foram transmitidos para os programas de Sutherland, e produziram o primeiro wireframe 3D de um carro. Na verdade, o primeiro modelo 3D de qualquer coisa física da história. O modelo era só a superfície externa da carroceria do Besouro, sem pára-choques, maçanetas, etc, embora tenham sido incluídos detalhes como as setas, abertura das janelas e molduras dos faróis. O modelo mostrou-se incrivelmente valioso como objeto de testes para o trabalho da equipe, e foi usado para testar as primeiras técnicas de renderização, como o trabalho de Bui Tuong Phong, o vietnamita que produziu uma imagem do Fusca que foi a primeira imagem gerada por computador que parecia o modelo físico. É muita coisa, se você parar para pensar.
Em 1975, Martin Newell criou a primeira chaleira renderizada que acabaria se tornando o padrão para testes em 3D. Mas a chaleira foi apenas desenhada em um papel, e então traduzida em dados numéricos. O Fusca, maior e mais complexo, nunca conseguiu o statos de objeto de testes como a chaleira, mas ainda tem a distinção de ser o único ancestral de todos os carros em Forza ou Need For Speed, ou Gran Turismo, ou de qualquer outra coisa que tenha sido escaneada do mundo real e transformada em dados virtuais.
Ainda é possível encontrar os dados originais na internet como .DXF ou .3DS ou outros tipos de arquivos, mas é preciso escavar para achar um arquivo genuíno. Acho que tenho uma recriação (mostrada acima em meu app 3D) datada de 1985, o que torna plausível a hipótese de que seja uma cópia dos dados originais. Recomendo todos os interessados em modelagem 3D que baixem o arquivo, já que é como se um pintor pudesse fazer um download da Mona Lisa. Ou quase isso.
Gostou da Publicação? Vote e comente sobre ela!
Respeite os direitos autorais, sugestione postagens e contate-nos para qualquer dúvida.
0 comentários:
Postar um comentário